Laboratório de Humanidades,
Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray:
um poema em prosa.
Às amigas Rozélia e Jacqueline.
Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray:
um poema em prosa.
Às amigas Rozélia e Jacqueline.
Esvaneço de mim o que é cinzento, porque é do branco mais branco ao negro mais negro que a vida rutila. E o impacto se dá. Dorian Gray me atirou ao fogo negro. Estou ardendo. Quase cedendo à corrupção de algum livro amarelo. Você sabe como posso encontrá-lo? Me iniciaria em seus prazeres devassos? Exerceria sobre mim sua má influência? Ora, não se inquiete, que eu prescindo de você. Tenho o meu próprio veneno e salvação: as palavras que em mim fervilham [e contrastam minha alma sem vida].
Dorian Gray e eu passamos pela mesma sensação de fronteira ao conhecer Lorde Henry Wotton no ateliê do pobre, bom e apaixonado Basílio. Sentimos receio, e frenesi. Não ria! Sei que não sofro da beleza perfeita de Dorian Gray, mas as cínicas provocações, as verdades e meias verdades sedutoras e paradoxais de Harry me soaram como quando as bruxas de Shakespeare proferiram as tais palavras insidiosas que despertaram a ambição desmedida em Macbeth. Em Dorian Gray, as cordas da vaidade e do orgulho é que foram tocadas. Em mim, outra vez, é a voragem que ressoa.
O infinito e o abismo, abstrações concretas que suspendem o tempo e que resgatam em mim o sentimento oceânico. O que mais me fascina na literatura, e na arte, e no ser, é a experiência infinita do abismo. É o afã de quem beira crateras nos confins da existência. E reconhece no mal a dinâmica do belo, porque atrai.
Mas o que me atrai? Não é o capricho perverso que aniquila, mas a vida que se quer inteira, na audácia de vivê-la até as últimas consequências. "Cada um de nós carrega em si o céu e o inferno", disse Dorian Gray ao inocente Basílio. E é por isso que me sinto tomado, pela escatologia do bem e do mal ao alcance da boca, já que é no vão negro, no mais profundo escuro de mim, que a beleza faísca.
E o que é a beleza senão faísca?